Certezas - crônica
Certezas
Antônio caminhava lentamente pela
calçada de sua rua. Sentia-se bem, tranquilo e estava bem sereno. Parecia que
os fatos recentes de sua vida haviam cessado ou mudado de abrangência e
características. Ele sabia que nada duraria para sempre, aliás, ele tinha
certeza disso.
Nem tudo o que planejara,
aconteceu; nem tudo o que queria, tomou forma ou conseguiu, mas isso não lhe
parecia algo ruim agora, não agora. Seu pesar havia abrandado dentro de seu
coração. Seus pensamentos não estavam mais turvos ou acelerados. Sua disritmia
emocional transformou-se em calmos passos de uma caminhada tranquila. O andar
do justo, a visão de um futuro simples, sem se ater à ele ou ao passado.
Antônio sabia, ele sabia.
Acontece que tudo isso, da forma
como se sentia: simples e calmo, também era uma condição aplicada, algo quase
que planejado... e como ele mesmo já sabia, não duraria muito. As ruas não são
linhas retas, nem são livres de defeitos. Elas possuem buracos, desníveis e
obstáculos. Caminhar de forma segura ao imaginar que será uma caminhada
tranquila, é andar por entre as dificuldades reais de uma rua real como os
cegos às enfrentam; Antônio sabia também, que da mesma forma que os sentimentos
mudam de ruins para bons, seu caminho inverso é inevitável em algum momento, e
mais, alguns podem se embaralhar, formando um mosaico confuso de sensações.
Tudo o que Antônio queria era
poder chegar em casa tranquilo, com aquela sensação que havia começado a rua. Estava
bem perto. Tentou não dar importância às confusões que agora voltavam com
força. Sabia que sua casa seria um refúgio tranquilo, longe das tentações que a
rua lhe oferecia; longe das possibilidades que a rua lhe mostrava. Subterfugiava
cada pensamento e diminuía o fluxo de ideias, pois sua porta estava bem perto.
Enfim chegou ao seu destino. Nunca
uma rua de cem metros pareceu tão longa. Tirou as chaves do bolso, respirou
fundo e a encostou na fechadura. Retirou-a. Baixou a cabeça e sentiu que não
podia deixar as confusões lá fora, talvez saboreá-las ou entregar-se às mesmas,
fosse algo tão estúpido quanto abrir aquela porta. Agora, o sentimento brando e
a disritmia se alinhavam novamente.
Girou nos calcanhares, voltou-se
à rua e retomou a caminhada de volta. Antônio estava entregue ao acaso
novamente, sentia-se livre e certo do que queria, mas ele sabia que nada
duraria para sempre, aliás, ele tinha certeza disso.
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